Os governos neoliberais e o bem comum:
qual a diferença?
Rousseau, em "El Contrato Social, II, 6", diz-nos:
“O que está bem e em conformidade com a ordem é-o pela
natureza das coisas e independentemente das convenções humanas. Toda a justiça
provém de Deus, só Ela é sua fonte. Se soubéssemos recebe-la do alto, não
teríamos necessidade nem de governos nem de leis. Sem dúvida que existe uma
justiça universal, só a razão emana tal justiça, porém para ser admitida entre
nós, deve ser recíproca. São necessárias, pois, convenções e leis para unir os
direitos aos deveres e encaminhar a justiça ao seu objetivo. Chamo, pois,
república a todo Estado regido por leis (seja democracia, aristocracia ou
monarquia), porque então somente o interesse público governa e coisa pública algo representa. Todo o governo legítimo é republicano.”
O poder tem nas suas mãos as pontas
dos fios que tudo movem. Jürgen Habernas, na sua obra El conocimiento e interés, parte da ideia teórico-prática de que o conhecimento
se guia ou está estruturado por algum tipo de interesse.
Habermas não entendia como uma cultura
como a alemã, que se tinha formado a partir de uma tradição teórica, que ia
desde Immanuel Kant a Karl Marx e cujo perfil doutrinal se baseava na liberdade
e na autonomia do homem, tinha caído no nazismo.
É importante ressaltar que Adolf
Hitler acedeu ao poder através de eleições democráticas.
Das leis vigentes dependerão
invariavelmente os povos, a recompensa e o castigo, de que estes sejam livres ou
escravos, de que estejam contentes ou vivam na mais miserável pobreza. Dizia
Jean--Jacques Rousseau que não importava muito que os governos fossem
democráticos, aristocráticos ou monárquicos, porque o que dá a legitimidade aos
governos são as leis que beneficiam a comunidade e que avancem com o bem comum.
Dos totalitarismos temos que
desconfiar continuamente e estar alertas.
Um vendedor de ataúdes deseja que as
pessoas morram, não porque as odeie, mas porque de outra maneira ninguém
compraria ataúdes.
As democracias neoliberais aspiram a
perpetuar as ditaduras: ditaduras dos mercados e as multinacionais, deixando fora
de jogo os governos e manejando-os como marionetas.
Temos que dizer que cada democracia tem
uma cor distinta em função dos poderes que as manejam; muitas vezes, as leis
constitucionais ficam em águas turvas, daí se deduz que o cariz que tomam as
circunstâncias sociais flutuam em função de vários fatores, tais como: os
antecedentes históricos, o nível cultural, os recursos humanos, naturais e
tecnológicos, a conduta moral, etc.
Deste modo, podemos assinalar que a
criação das constituições não corresponde a um ato negativo, mas estas sim, apresentam
deficiências porque omitem uma série de leis que aludem a uma realidade social mais justa e
equitativa.
As democracias podem-se classificar
com base em factos que aconteceram dentro de um contexto histórico. Nomearei,
então, alguns estados democráticos:
Estado espanhol ou democracia
franquista
Depois de quarenta anos de ditadura
franquista, a sua queda, por si só, era iminente e a agonia estampava-se até ao mais ínfimo
suspiro. Não obstante, no
processo de reconciliação nacional que empreenderam ou pactuaram os partidos
democráticos e os partidos da esquerda com os políticos franquistas, estes
últimos saíram altamente favorecidos. Os democratas e a esquerda que se
empenharam em ganhar, pois eram tempos muito favoráveis, perderam a batalha e não
instauraram uma democracia verdadeira em Espanha.
Existem muitos pontos negros que obscurecem,
em grande parte, o processo de reconciliação: “o que mal começa mal acaba”. A via vermelha
eclipsou-se e à via azul calhou-lhe a “sorte grande”, visto se terem eliminado, de repente,
todos os crimes realizados pela ditadura.
Até então, estes crimes foram
perpetrados a pessoas inocentes que eram arrancadas das suas casas para serem
assassinadas, não só durante a guerra (guerra que empreenderam estes militares
golpistas, com Franco à cabeça, contra um governo constituído por intermédio das
urnas), mas também depois desta, em que houve uma repressão terrível, com assassinatos contínuos.
Convém recordar que os crimes contra a
humanidade nunca prescrevem e estes foram crimes.
Ainda que a justiça histórica em
Espanha careça de existência, estes crimes não foram resolvidos juridicamente e
nenhum partido ou entidade pode silenciar um facto histórico desta natureza.
Desta maneira, o pacto para a
reconciliação levava implícito o germe do assassinato, nestas condições, é
impossível distinguir a esquerda da direita, visto as duas se situarem ao mesmo
nível, estando acima da justiça.
Isto explica que o percurso da democracia
espanhola esteja repleto de incidentes: tentativa de golpes de estado, como o
23 F; que a direita espanhola nunca tenha efetuado uma condenação moral dos crimes do franquismo; que qualquer
tentativa para recuperar a memória histórica seja rejeitada e silenciada, como
no caso do juiz Garzón. Trata--se duma conceção democrática, onde os recursos/meios
franquistas se elevam acima da constituição.
Estados Unidos ou democracia
beligerante
A essência da democracia dos Estados
Unidos desenrola-se, na realidade, sob a forma dos seus atos manifestos, estes
atos prestam-se a ser investigados por todo aquele que tenha um mínimo de
ética. As ações bélicas e não-beligerantes, como são os bloqueios económicos, não
partem dum processo dialético com argumentos razoáveis para ditas ações.
Eles inspiram-se numa visão primária
que subjaz nas profundezas da sua psique,
só consiste em saber que o meu e o teu são dois e se aos dois somar um outro dá
três e uma vez que tenha três, posso ficar com todos os outros. As duas forças
primordiais com as quais se conta para roubar o ouro e o mouro são os
“troca-tintas” de todos os meios de comunicação do mundo; a outra força
primordial é a NATO, a força militar mais poderosa da Terra e que é controlada
por todos eles.
Assim, a mãe de todas as democracias, à
força, anseia poder ter toda a supremacia existencial, ou seja, a perpetuidade,
ainda que deixe muitos povos na mais absoluta ruína.
Convém recordar que tudo o que acontece
sob o Sol, o Céu percebe, e que quem semeia ventos, colhe tempestades. Nunca
houve na Terra nenhum império eterno, todos eles beberam do cálice da sua obra.
“Depois um anjo poderoso levantou uma pedra do
tamanho de uma mó de moinho e lançou-a ao mar, dizendo: Assim e com o mesmo
ímpeto, será lançada Babilónia, a grande cidade! E nunca mais será encontrada.”.
Apocalipse 18:21